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Irreconciliado e insubmisso: a estética do Colectivo Los Ingrávidos

Irreconciliado e insubmisso: a estética do Colectivo Los Ingrávidos

Desde 2012, quando iniciou suas atividades na cidade de Tehuacán, México, o coletivo Los Ingrávidos tem se dedicado ao questionamento crítico das narrativas históricas, problematizando como imagens e sons podem ser utilizados como tecnologias ideológicas a serviço do poder institucional do estado. Sinalizando a fusão entre forma e substância, sua produção explora as tecnologias ligadas à história e à representação, concentrando-se especialmente na persistência dos mecanismos de extração colonial, abrangendo arquivos, museus e meios audiovisuais.

Homônimo ao primeiro romance da escritora mexicana Valeria Luiselli, publicado em 2011, que entrelaça histórias de personagens marcados pelo “deslocamento e contaminação entre línguas e culturas, entre o tangível e o fantasmagórico, entre o presente e o passado, entre o mundo dos vivos e o mundo dos mortos” (Russo, 2024, p. 270), Los Ingrávidos denomina aqueles imunes ou insubmissos à gravidade e associa-se à capacidade de levitação. Dessa forma, vincula-se a uma ideia de insubordinação à normatividade e sugere uma sensação de liberdade e transcendência. Integrado ao conjunto de práticas cinematográficas geralmente classificadas como experimentais, o grupo possui uma produção herdeira das vanguardas do século passado, estabelecendo conexões com o ativismo político e as novas mídias.

Relacionando o passado pré-colombiano para insurgir-se contra as violências do presente, o coletivo envolve-se em práticas intertextuais, frequentemente utilizando materiais de arquivo como forma de reativar e atualizar mídias produzidas em contextos diversos, revisitando e ressignificando eventos e períodos históricos. Geralmente empregadas com o propósito de evocar cosmologias mesoamericanas, também produzem imagens autorais, demonstrando notável interesse, por exemplo, por existências não-humanas, tais como figuras da natureza, paisagens geográficas, formas de relevo, cursos de água, espécimes de plantas e animais, sítios arqueológicos e objetos históricos.

Como forma de confrontar a utilização do audiovisual como tecnologia ideológica, o coletivo faz uma série de escolhas estéticas, de produção e de distribuição que desafiam as formas mais habituais e comerciais do audiovisual e do cinema, as quais serão abordadas ao longo deste texto. No primeiro tópico, serão apresentados o contexto regional e o posicionamento artístico do coletivo a partir do exemplo do filme Transmissión/Desenquadre (2014). O segundo tópico trata brevemente da importância da noção de irreconciliável – a inviabilidade de resolução dos antagonismos estruturais inerentes à realidade cultural, histórica e social do capitalismo tardio – no contexto da indústria cultural. No terceiro tópico, abordarei como o irreconciliável influi na organização do coletivo. No quarto tópico, discutirei como o irreconciliável afeta a proposta estética do grupo e, em seguida, analisarei as obras Coatl (2015) e Pirámide Erosionada (2019) em relação às escolhas cinematográficas. No quinto e último tópico, apresentarei um resumo dos conceitos autorais tal como propostos pelo coletivo em suas Teses sobre o Audiovisual (2021).

I.

Um exemplo emblemático de sua abordagem crítica às narrativas históricas pode ser observado em uma de suas primeiras e mais conhecida obra, Transmissión/Desenquadre (2014). Este filme é construído a partir da combinação de diversos elementos audiovisuais: uma fotografia de arquivo impressa, registrada digitalmente em um único plano de quatro minutos e meio, acompanhada por duas gravações de narrações jornalísticas sobrepostas a uma trilha sonora de tom enigmático e tenso. A disposição de diferentes artefatos de mídia em relação dinâmica entre si é um aspecto recorrente na produção do coletivo. Esses elementos são empregados como estratégia para desestruturar a narrativa oficial acerca do massacre de Tlatlaya, ocorrido em junho de 2014, quando 22 indivíduos foram brutalmente assassinados por forças militares.

Como em diversos outros filmes do coletivo, o título é composto por duas palavras separadas por uma barra oblíqua ‘/’. Mais do que uma forma deliberada de nomeação, a presença deste sinal gráfico indica um método de trabalho que permite conectar dois fragmentos em uma relação não predefinida. A barra oblíqua pode ser considerada “uma figura de montagem que possibilita repensar as condições de possibilidade de toda articulação entre imagens, palavras, sons e vozes” (Errazu, 2018, p.122). A primeira palavra, Transmissión, denota um caráter de urgência e disseminação próprios de formas de contra-comunicação. Inclusive, o filme foi rapidamente produzido e disponibilizado online logo após os assassinatos. Frederico Windhausen (2019, p 101) salienta que dado o contexto regional, ainda amplamente dominado pelos meios de comunicação corporativos e estatais, essas transmissões audiovisuais demonstram claramente a pertença à esfera contra-pública latino-americana. Desenquadre expressa a politização deste filme, que se realiza na dualidade entre enquadramento e desenquadramento, o visível e o invisível, ou, o que é seletivamente incluído ou excluído. Uma barra conecta os termos, ao mesmo tempo que induz uma separação, uma descontinuidade. É a ligação do descontínuo, uma emenda que, ao mesmo tempo que conecta, manifesta uma diferença em jogo (Russo, 2024, p. 272).

Enquanto assistimos a imagens em movimento que nos apresentam uma fotografia de arquivo de cinco soldados, um dos quais empunha uma bandeira mexicana, escutamos uma transmissão de rádio em que dois jornalistas comentam e descrevem uma outra imagem que nos é omitida. Windhausen (2019, p. 97) resume o filme como uma obra com uma substituição ou deslocamento enganosamente simples em seu centro, pois apresenta uma imagem em movimento evidentemente simbólica enquanto discute uma imagem estática.

Durante o tempo em que a fotografia do grupo de militares em pose triunfante é lentamente deslocada por formigas, revelando sua posição sobre um formigueiro, a narração esclarece que a narrativa estatal, que alegava combater pretensos criminosos, é desmantelada pela publicação de uma fotografia das vítimas no periódico La Jornada. Segundo os jornalistas, a divulgação desta imagem levou criminologistas a apontarem a impossibilidade de o evento ter sido um confronto entre duas partes, como alegado pela força militar. A disseminação internacional dessa imagem tornou inevitável o confronto entre diferentes versões e corroeu a credibilidade da narrativa estatal. Como destacou uma das vozes no filme, as fotografias estão “circulando pelo mundo” e sua ampla difusão foi crucial para o “desmantelamento” da versão oficial dos acontecimentos.

Figura 1: Transmission/Desencuadre (2014)
Fonte: https://www.viennale.at/en/film/transmissionmisframing

O contraste entre narrativas exposto no filme expressa uma rejeição da aceitação passiva de narrativas hegemônicas e da pacificação ideológica, aspectos que sustentam estruturas de opressão. A filmografia do coletivo é marcada por um posicionamento frontalmente contrário ao apagamento das marcas da violência colonial, do extrativismo e do autoritarismo sistêmico. Entre os exemplos que se destacam, estão Memorial (2019), cujo tema é a mobilização popular em homenagem à memória das vítimas do massacre de 2 de outubro de 1968 em Tlatelolco; Numbers (2020), em que retratos da coleção do Museo del Prado nos oferecem “o rosto do extrativismo, da pilhagem da Mesoamérica, bem como do ecocídio realizado com mineração e trabalho escravo, destruindo os ecossistemas e o modo de vida dos povos” (Escobar López, 2020); e Conversión (2021), obra que articula imagens institucionais do Museo de América, em Madrid, com áudio de um testemunho cristão proferido em língua espanhola, promovendo um tensionamento do conceito de conversão em termos de violência espiritual, cultural e epistemológica promovida pela ocupação colonial e em constante atualização e transmissão comunitária. Portanto, muitos de seus filmes não oferecem resolução; ao contrário, persistem em um estado de desconforto crítico que explora o âmbito do irreconciliado.

Não reconciliar ou manter-se irreconciliado é um posicionamento crucial para o grupo e essencial para a contextualização e compreensão da proposta artística do coletivo Los Ingrávidos. Conciliação e reconciliação, apesar de relacionadas, possuem nuances que as distinguem.

Segundo a definição do Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (Houaiss Online), conciliação possui o sentido de “associação, união, benevolência, ação de procurar”. Trata-se do ato ou efeito de apaziguar-se com algo ou alguém; pacificação, acomodação, pôr (ou porem-se) em acordo com a parte litigante, ou de harmonizar instâncias ou pessoas desavindas ou discordantes (Instituto Antônio Houaiss, n.d.). Ainda de acordo com o Houaiss Online, reconciliação significa “restabelecimento” e, no âmbito religioso, expressa “renovação”; por exemplo, a renovação da confissão no contexto católico oferece uma redenção que reconcilia o fiel, absolvendo seus pecados e respectivas consequências (Instituto Antônio Houaiss, n.d.).

Em síntese, a conciliação é o processo de resolução de conflitos por meio da negociação de um acordo complacente e pode ser entendida como o esforço de apaziguamento de diferenças com o objetivo de restaurar harmonia entre as partes. Já a reconciliação é mais profunda e envolve a restauração de relações quebradas ou a reintegração de partes separadas ou em desacordo.

Considerando os campos político e social, a reconciliação implica processos profundos de reconhecimento das faltas históricas, anistia e fomento de confiança recíproca, visando à edificação de um porvir comum. Como exemplo, destacam-se processos de justiça restaurativa em sociedades pós-conflito, como a Comissão da Verdade e Reconciliação na África do Sul pós-Apartheid. Em vista disso, o não reconciliado diz respeito à rejeição ativa do acordo, do apaziguamento ou da pacificação com forças de poder opressivas. O irreconciliável designa a impossibilidade de harmonização, geralmente descrevendo diferenças profundamente incompatíveis e, portanto, impossíveis de coexistir sem conflitos.

II.

Em Dialética do Esclarecimento, Theodor W. Adorno e Max Horkheimer desenvolvem uma análise do projeto iluminista e suas consequências paradoxais para a sociedade moderna. O argumento central é que o Iluminismo, que prometia emancipação e libertação social por meio da razão, progresso e domínio da natureza, em última análise, terminou por realizar novas formas de dominação, opressão e barbárie. No cerne de suas reflexões, encontramos o conceito de dominação, especialmente em termos da relação entre o sujeito (a consciência individual ou humana) e o objeto (o mundo externo, incluindo a natureza, outras pessoas e produtos culturais).

A pretensão de superar o mito através do esclarecimento, termina por renová-lo uma vez que a razão, tornada instrumental (uso do conhecimento e da tecnologia como ferramentas de controle), impõe um modelo rígido de pensamento que elimina qualquer perspectiva diferente. Autoritária e totalitária, a racionalidade radicalizada opera de forma a promover a desumanização e a repressão da individualidade, subordinando todas as esferas da vida a critérios de utilidade e controle. Isso se manifesta, por exemplo, na instrumentalização do conhecimento para fins de dominação, na reificação das relações sociais, e na indústria cultural.

A análise de dois dos principais teóricos da Escola de Frankfurt é pautada no contexto do início a meados do século XX, um período marcado pela ascensão da cultura de consumo, a expansão da mídia de massa e a consolidação da lógica capitalista sobre a produção cultural. Como expressão da sociedade industrial avançada, descrevem a indústria cultural como resultado da crescente integração da cultura no sistema capitalista de produção e consumo. A dominação da natureza e a instrumentalização da razão são estendidas à esfera cultural, subsumindo a criatividade e a singularidade.

A cultura que, de acordo com seu próprio sentido, não somente obedecia aos homens, mas também sempre protestava contra a condição esclerosada na qual eles vivem, e nisso lhes fazia honra; essa cultura por sua assimilação total aos homens, torna-se integrada a essa condição esclerosada; assim ela avilta os homens ainda uma vez. (Adorno, 1978, p. 288)

Organizada como um sistema em que bens culturais são produzidos, distribuídos e consumidos de maneira estandardizada e mercantilizada, a indústria cultural ocupa um espaço outrora privilegiado para expressar as contradições sociais, transformando-o em um âmbito celebratório da ordem social vigente, mascarando tensões e injustiças estruturais, o que termina por reforçar as condições de dominação. O campo da cultura e as obras de arte perdem sua relativa autonomia e capacidade de contestação e negação. Enquanto o pensamento crítico é enfraquecido e a singularidade criativa é suprimida, promove-se, uma fruição passiva e uma sensação superficial de conforto que aliena e oculta as contradições e desigualdades da ordem social, em favor de um consumo resignado que inibe o engajamento cultural ativo e reflexivo.

Por enquanto, a técnica da indústria cultural levou apenas à padronização e à produção em série, sacrificando o que fazia a diferença entre a lógica da obra e a do sistema social. Isso, porém não deve ser atribuído a uma lei evolutiva da técnica enquanto tal, mas à sua função na economia atual. (Adorno e Horkheimer, 1985, p. 100)

A conversão de bens culturais em produtos passa a governar a produção cultural e a subordiná-la completamente às dinâmicas de reprodução social. Não são criações artísticas que, em um momento posterior, são convertidas em mercadorias, ao contrário, são diretamente concebidos com finalidade de atender ao mercado. Sob o domínio da indústria cultural, o valor de troca passa a prevalecer sobre o valor de uso das obras, são apenas mercadorias que podem ser compradas e vendidas.

Se a mercadoria se compõe sempre de valor de troca e do valor de uso, o mero valor de uso – a aparência ilusória, que os bens da cultura devem conservar, na sociedade capitalista – é substituído pelo mero valor de troca, o qual, precisamente enquanto valor de troca, assume ficticiamente a função de valor de uso. (Adorno, 1978, p. 78)

Ainda assim, Adorno acredita que haveria possibilidade de manutenção da tensão entre indivíduo e sociedade em algumas expressões artísticas. No seu entendimento, a obra de arte autêntica existe como uma forma de negatividade crítica que se opõe à totalidade reconciliada e resiste à pacificação ideológica promovida pela indústria cultural.

Para a crítica imanente uma formação bem-sucedida não é, porém, aquela que reconcilia as contradições objetivas no engodo da harmonia, mas sim a que exprime negativamente a ideia de harmonia, ao imprimir na sua estrutura mais íntima, de maneira pura e firme, as contradições. (Adorno, 1998, p. 23)

A obra de arte autêntica, ao revelar e analisar as dissonâncias da sociedade, não apenas demonstra a impossibilidade de uma verdadeira reconciliação no cenário da modernidade tardia, mas também integra essas contradições em sua própria forma. Ao incorporar tensões e conflitos sociais em sua estética, ela reflete, mesmo que de modo indireto, a necessidade de uma transformação social e a busca pela emancipação.

III.

Los Ingrávidos concebe sua produção audiovisual como uma forma de resistência, na qual as contradições sociais são expostas e confrontadas através do trabalho estético. Nesse sentido, é justamente a dimensão irreconciliável discutida no tópico anterior que sua filmografia busca potencializar, criando um espaço para a ruptura e o questionamento das narrativas hegemônicas.

Sua prolífica produção pode ser entendida como parte da marcante tradição de dissidência ideológica e protesto político que caracteriza os Cinemas Novos da América Latina (Rocha, 1965; Xavier, 2012; Nagib, 2011), que buscaram romper com as convenções narrativas e formais do cinema industrial, propondo uma estética comprometida com a crítica social e a experimentação (Stam, 2003). Com o objetivo manifesto de desmantelar a gramática audiovisual do corporativismo estético-televisivo-cinematográfico enquanto ordem audiovisual proposta pelo poder, seus filmes estabelecem diálogos entre o cinema político das décadas de 1960 e 1970 – caracterizado pela militância estética e pelo engajamento revolucionário (Solanas & Getino, 1969) – e o percurso programático do cinema experimental, da videoarte e práticas de agitprop.

É importante destacar o caráter coletivo e anônimo do grupo, cuja composição permanece desconhecida, tanto em número quanto em identidade de seus membros. Ao atuar de forma anônima e colaborativa, Los Ingrávidos rejeita o protagonismo autoral como estratégia de resistência à lógica individualista do mercado cultural. Dessa maneira, sua postura não reconciliatória vai além das escolhas formais, refletindo-se também na estrutura organizacional do coletivo. Eduardo A. Russo (2024) observa que o anonimato adotado pelo coletivo não se configura apenas como uma escolha estética ou conceitual, mas também como uma estratégia de proteção essencial para seus integrantes. Em um contexto de violência política no México, onde a liberdade de expressão é constantemente ameaçada, essa postura se torna uma medida preventiva fundamental.

O coletivo inicia suas atividades a partir das manifestações de massa contra o governo mexicano, utilizando um canal anônimo no YouTube. No website da OISFL Repórteres sem Fronteiras1 consta que “ano após ano, o México continua sendo um dos países mais perigosos e mortais do mundo para jornalistas”. O modus operandi colaborativo também reflete uma opção deliberada, em sintonia com os princípios políticos de autoria coletiva promovidos pelo movimento do Terceiro Cinema na América Latina. Em resumo, sua abordagem operacional contempla tanto a proteção da identidade dos integrantes quanto uma oposição ao sentido individualista da lógica do autor.

Ademais, a franca disponibilização dos trabalhos na internet antagoniza as normativas de mercantilização da propriedade intelectual, marcando um posicionamento avesso à relação de valorização e riqueza vinculadas à escassez. Sem descartar de forma absoluta, o coletivo recusa restringir-se aos espaços tradicionais de distribuição relativos a equipamentos e eventos culturais, como festivais de cinema, galerias ou museus. Em sua página do Vimeo2, estão disponíveis quase seiscentos filmes para visualização e até download gratuito, além de estar presente em diversos outros endereços virtuais do campo do cinema e das artes visuais, realizando, assim, uma reorganização e ampliação das possibilidades de distribuição e consumo de sua obra fílmica, tornando-se cada vez mais uma referência regional com alcance global.

Através da auto-distribuição online, o grupo demonstra uma possibilidade de autonomização sobre as instâncias de mediação comercial do mercado cinematográfico e filia-se a uma importante tendência de cineastas e coletivos audiovisuais do sul global que se esforçam para integrar suas perspectivas a debates internacionais, por exemplo, os chilenos MAFI3 (Mapa Fílmico de un País),  Colectivo VlopCinema4 (Venganza Latinoamericana Organizada del Pueblo junto al Cine), o argentino Colectivo Situaciones5 e o egípcio Moisreen Collective.6

IV.

Em termos cinematográficos, o irreconciliado em Los Ingrávidosse manifesta através da fotografia, da montagem e do som. São práticas visuais, sonoras e narrativas que desafiam o realismo convencional e as formas padronizadas de representação. Organizados de forma a subverter a normatividade do regime audiovisual, como foco centralizado, narrativa linear e realismo visual, os filmes do coletivo se realizam na dimensão oposta, através da dispersão e pluralidade, da fragmentação e irregularidade e do uso político da abstração.

A fotografia dos filmes de Los Ingrávidos é marcada especialmente pelas sobreposições e manipulações de cor e luz, pelas práticas intertextuais, especialmente através do uso de imagens de arquivo, pela intensa mobilidade que confere um senso de corporalidade às imagens, e pela busca de uma rejeição ao antropocentrismo visual através da investigação de perspectivas não-humanas como nos exemplos dos filmes Coatl (2015) e Pirámide Erosionada (2019) analisados nos próximos parágrafos.

Questionando e tensionando regimes visuais hegemônicos investidos num ideal de transparência, o coletivo deliberadamente recusa a representação realista, apontando para a opacidade e a abstração da imagem como um posicionamento político. Resistindo à lógica integradora, buscam romper com a limpidez que entendem como utilitária e colonizadora dos sentidos, deslocando a atenção para a materialidade da superfície da imagem através de grãos, pixels e texturas, compondo uma proposta estética que evoca o invisível, o transcendente e estados hipnagógicos.

Considerando as continuidades e atualizações dos processos coloniais, especialmente no que diz respeito às práticas extrativistas que sustentam a violência estrutural, os filmes Coatl (2015) e Pirámide Erosionada (2019) empreendem um esforço deliberado em rejeitar o antropocentrismo visual através da exploração de perspectivas não-humanas como forma criticar a dominação do sujeito frente ao objeto.

Coatl (2015), termo náuatle traduzível como “serpente” e que, em algumas culturas mesoamericanas, está associado a divindades e rituais espirituais, emula o que seria a experiência visual de uma serpente em deslocamento pelo solo de seu habitat natural. Acompanhado por uma trilha sonora percussiva, o filme apresenta sua perspectiva reptiliana: a câmera, em constante movimento e posicionada em plano extremamente baixo, nos mostra o que a serpente enxergaria enquanto rasteja, empurrando folhas secas e partes de plantas no caminho, abrindo espaço entre esses obstáculos para realizar sua trajetória. Com um campo focal extremamente próximo, podemos observar minuciosamente os detalhes das venações das folhas secas enquanto o fundo permanece desfocado. A oscilação da luz é um elemento predominante, com metade da tela frequentemente escurecida e momentos em que fica completamente preta, sugerindo que, nesse caso, seria necessário mais do que apenas os olhos para enxergar. A imagem é rotacionada em 90 graus, provocando uma reação instintiva no espectador de inclinar a cabeça para alinhar a imagem com a perspectiva humana convencional. Apesar da “transparência” fotográfica, que busca coincidir com a aparência da visão humana, definitivamente essa perspectiva não nos é familiar.

Figuras 2 e 3 – Coatl (2013). Fonte: https://lightcone.org/en/film-13144-coatl

Pirámide Erosionada (2019) documenta um assentamento pré-hispânico na região de La Canãda, México, e lida com o desafio de apresentar uma montanha que desapareceu. A breve sinopse do filme, ‘A pirâmide costumava ser uma montanha’, sugere uma referência histórica significativa: durante o século XIX e início do século XX, descobertas de pirâmides mesoamericanas frequentemente levaram à reinterpretação de montanhas como estruturas construídas por civilizações antigas. Exemplos notáveis incluem a Pirâmide do Sol em Teotihuacán e a Grande Pirâmide de Cholula, escavada em 1910. Abordando o desaparecimento de uma montanha, o filme trata das violências material e simbólica como formas de afirmação do poder colonial, apresentando, naturalmente, uma crítica aos processos que resultaram na destruição e apagamento do patrimônio cultural mesoamericano.

Figura 4: Pirámide Erosionada (2019). Fonte: https://www.facebook.com/ColectivoLosIngravidos

O território é apresentado de maneira fragmentada, com imagens que pulsam numa ritmicidade que dialoga com a trilha sonora improvisada de jazz de bateria do percussionista Gustavo Nandayapa. São lampejos das diferentes texturas da paisagem, criando um turbilhão de imagens em flicker. Vistas proximais oferecem vislumbres de formas rapidamente reconhecíveis, como plantas, pedras, flores, troncos e terra, alternadas com imagens desfocadas que dessingularizam os motivos, transformando-os em fluxos de cores que tendem à abstração. Em determinados momentos, a relativa estabilidade do quadro é mantida enquanto os elementos de atenção principal são revezados, criando breves sequências em que séries de pedras são apresentadas em um tipo rudimentar de animação stop-motion. Ao explorar o plano baixo, a câmera navega pela grama e entre plantações de milho, posicionando-se ao nível do solo para observar de perto a areia e as rochas.

Realizado em 16mm utilizando uma Bolex, todo o filme foi montado na própria câmera, resultando em uma obra que destaca a materialidade do meio cinematográfico. Em entrevista à pesquisadora Almudena Escobar López, o Coletivo comenta:

É uma pirâmide que perdeu sua verticalidade porque foi absorvida pela natureza; então, aqui o registro entra em uma espécie de transe. É uma paisagem entre dois mundos, uma paisagem hipnótica; é também um olhar ou ponto de vista das pedras, dos minerais, do musgo, da água, do rio, dos diferentes elementos que foram absorvendo a pirâmide, apagando e dissolvendo suas formas definidas e dando-lhe outro tipo de vida, outro ritmo psíquico, produzindo assim uma horizontalização da pirâmide, e no final nos permitindo perceber como a pirâmide costumava ser uma montanha. (Escobar López, 2020, p 5)

Figura 5: Pirámide Erosionada (2019). Fonte: https://www.facebook.com/ColectivoLosIngravidos

Ao lidar com o apagamento de um assentamento pré-hispânico, Pirámide Erosionada tensiona as noções de arquivo e patrimônio. Em vez de focar nos aspectos arqueológicos e forenses da ruína, as imagens oferecem uma compreensão animista da paisagem e propõem um entendimento alternativo do que um arquivo pode ser. Nas palavras de Almudena Escobar López, “Ao conectar o forense e o empírico com o espiritual, o xamânico e o poético, o coletivo propõe um novo conceito de arquivo fora da epistemologia ocidental” (2023, p. 271). Este documentário singular transcende o registro factual e manifesta uma expressividade latente. As descrições do animismo cinematográfico, com sua aptidão por revelar a aparência de vida das coisas e dos objetos, denotam a capacidade do cinema de redefinir as fronteiras entre o inerte e o vivo: “Desde as primeiras projeções ralentadas e aceleradas, foram rejeitadas as barreiras que nós havíamos imaginado entre o inerte e o vivo. Facilmente, o cinematógrafo mostra que não existe nada de imóvel, nada de morto” (Epstein, 1974, p. 244).

Considerando a montagem dos filmes, destaca-se a descontinuidade que oferece ao espectador uma experiência que abre espaço para o contraditório e o lacunar. O coletivo está comprometido com a brevidade duracional e formas fragmentadas que evidenciam a relutância em representar seus temas de forma abrangentemente compreensível (Windhausen, 2019, p. 100). Em outras palavras, Los Ingrávidos se interessa em promover colisões que favorecem a emergência de uma experiência relativa à multiplicidade de perspectivas, contrariamente à univocidade de um discurso. Diferindo da lógica espaço-temporal linear, progressiva e teleológica ocidental, “na Mesoamérica a espacialidade, assim como a temporalidade, é cíclica; não há fim do tempo e depois eternidade, mas transformações epocais, retornos, ciclos, recursões, fases, etc.” (Escobar López, 2020, p. 9). Assim, através da montagem, o coletivo privilegia um tratamento temporal disruptivo, cíclico, confuso e desordenado.

Expressando a coexistência de passado, presente e futuro, tornando-os experienciáveis através da fruição fílmica, a simultaneidade dos tempos expressa uma confluência entre contextos temporais comum às cosmologias mesoamericanas. Se pensamos em elaborar uma imagem para representar as diferentes concepções do espaço-tempo, podemos dizer que a episteme ocidental se aproximaria de uma linha reta (um conjunto infinito de pontos que se estendem em ambas as direções sem curvatura ou desvio), enquanto o espaço-tempo mesoamericano teria a aparência de uma forma fractal, que se repete em diferentes escalas de tamanho, exibindo autossimilaridade.

Ademais, esse tratamento da temporalidade expressa que opressões e violações que ocorreram em tempos passados, como o colonialismo e as violências sistêmicas, na verdade, não estão restritas ao que passou, mas são continuamente atualizadas (em formas como extrativismo, televisão, arquivos museais) e continuam a moldar o contexto presente, impossibilitando qualquer reconciliação. Assim, o irreconciliado expõe os conflitos irresolutos do colonialismo no mundo contemporâneo e está manifestado na recusa a uma totalidade coesa ou aparentemente harmônica.

Em última instância, o não reconciliado ou irreconciliável manifesta-se na forma de uso e tratamento da dimensão sonora. Historicamente subjugada à dimensão visual, a sonoridade atuava como um complemento, exercendo uma função ilustrativa ou intensificando a dramaticidade da imagem. Contudo, nos filmes do coletivo Los Ingrávidos, a dimensão sonora é concebida como absolutamente independente. De acordo com o entendimento do coletivo, a imagem visual e a imagem sonora operam de maneira emancipada, possibilitando uma complexificação da expressão fílmica e enriquecendo a experiência sensorial.

V.

O Coletivo Los Ingrávidos elabora, em Teses sobre o Audiovisual (2021), um manifesto que associa reflexões políticas e conceituais, contemplando temas como decolonialidade, estética e crítica à gramática normativa do aparato cinematográfico. Nesse manifesto, o coletivo desenvolve sua própria conceituação acerca do que seria o Materialismo Xamânico em sua prática artística. Esse conceito lida com a possibilidade de criar diferentes formas de narração de acontecimentos, investidas pelo coletivo como uma espécie de contra-história. Através de sua prática artística, o coletivo habilita processos de apropriação, organização e reformulação de narrativas históricas com o objetivo de promover um tipo de “neutralização” do processo colonial e suas respectivas violações de forma profunda. Em suas próprias palavras:

12 de outubro envolveu uma enorme colisão “sígnica”, e o que estamos tentando fazer é reformular, bem como, na medida do possível, neutralizar a violência dessa colisão com a recuperação de diferentes práticas “demoníacas”, como o presságio, o feitiço, a sugestão, a magia, o transe ou o encantamento. (Escobar López, 2020, p. 2)

Los Ingrávidoscompreende o processo de realização de seus filmes a partir da noção de Materialismo Xamânico, que envolve a reativação de superstições do passado e a valorização de formas de conhecimento não-objetivas, mobilizando a ancestralidade pré-colombiana como enfrentamento aos conflitos irresolutos herdados do colonialismo. Isto implica uma prática cinematográfica calcada em um investimento filosófico e especulativo, onde as esferas da ética e da estética se associam ao material e sensorial para promover uma mudança singularizada de percepção, realizada através da Estética do Transe. Iniciamos destrinchando um pouco os termos.

Na tese 22 do manifesto, consta: “Materialismo é o empírico, contingente, circunstancial, sensorial e a dimensão concreta de objetos, documentos, arquivos, restos mortais e elementos” (Los Ingrávidos, 2021). Dito de outra forma, a compreensão materialista do coletivo diz respeito aos conteúdos coletivos da imagem, que também poderiam ser descritos de forma aproximada como “elementos materiais” ou mesmo através da noção de “objetal” (podendo ser pensados tanto em termos visuais quanto sonoros). A nota de rodapé 4, que acompanha a referida tese, explica, de forma resumida, que o sentido materialista do materialismo xamânico situa todos os materiais audiovisuais em “um horizonte de contingência radical, como um campo de indiscernibilidade comum a todos os conteúdos coletivos da imagem”. Isso significa que os elementos audiovisuais são entendidos em um estado de incerteza, indiscernibilidade e compossibilidade, onde seus significados e relações não são fixos, mas mutáveis e em constante reinterpretação. Ou seja, esse estado não diferencia as imagens e os sons em termos de hierarquias ou propriedades; assim, os conteúdos audiovisuais tornam-se indistinguíveis uns dos outros em termos de importância ou significado, compartilham uma base material comum e dependem do contexto em que estão inseridos e das conexões que estabelecem com outros signos e símbolos.

Considerando que imagens e sons são entendidos como relacionais, é habilitado um “princípio autofágico”, cuja natureza é a afetação mútua: os elementos continuamente se consomem e se transformam, o que promove uma abordagem dinâmica e fluida que comporta a interdependência e a mutabilidade de seus significados. Por sua vez, essa relacionalidade promove um dinamismo intenso, uma “explosão rítmica” que opera em dois níveis: primeiramente, a não comutatividade radical (a ordem dos elementos altera o resultado), que demanda uma descontinuidade essencial, a não-linearidade, onde os elementos audiovisuais não se relacionam de forma previsível, mas através de repetições disjuntivas; e, em segundo lugar, a tensão entre continuidade e expansividade, ou seja, uma incessante disputa que configura a experiência audiovisual como algo disforme, fluido, e sempre em expansão (um sistema no qual as interpretações e significados das imagens podem ser estabelecidos de forma aberta, possibilitando variações e mudanças dinâmicas conforme novos contextos e percepções surgem). Em suma, através do princípio autofágico é habilitada uma relacionalidade dialética que consiste na capacidade de elementos distintos interagirem de maneira a promover o desenvolvimento e a transformação.

Recapitulando de maneira mais esquemática, o materialismo diz respeito à fisicalidade e aos aspectos concretos dos objetos. A contingência dos conteúdos é definida por sua qualidade mutável e contextualmente dependente. A autofagia refere-se à capacidade das imagens de produzirem e reconfigurarem seus próprios significados internamente. A não comutatividade implica uma fratura da temporalidade, na qual os períodos históricos passam a compartilhar um estado de compossibilidade, podendo alterar nossa percepção ou experiência do tempo.

Ou seja, o materialismo xamânico demanda a condição de contingência radical, equivalente à indiscernibilidade comum a todos os conteúdos coletivos da imagem, o que, por sua vez, habilita o princípio autofágico de relacionalidade. Isso conduz à parte xamânica, onde o material audiovisual se vincula à indução do transe por meio de intervenções, texturas e ritmos que possibilitam um tipo de arrebatamento sensorial. Aqui, o transe é uma experiência estética viabilizada pela manipulação dos materiais audiovisuais, capaz de desencadear arrebatamento e provocar transformações significativas na percepção, explorando estados alterados de consciência e promovendo novas formas de relação com o mundo.

O aspecto xamânico do materialismo xamânico introduz a ideia de que o material audiovisual pode ser ativado, ritualizado e transformado, mobilizando o espectador por meio de três procedimentos estruturantes descritos nas teses 12, 13 e 14 (Los Ingrávidos, 2021), respectivamente: Possessão perspectivista – relacionada à teoria antropológica do perspectivismo e à qualidade xamânica que permite experienciar a perspectiva de outros entes; Conversão transformacional – capacidade de promover mudanças materiais desde o campo sobrenatural, como parte de um processo de cura ou ritual; Ligação especulativa – faculdade criativa de estabelecer conexões simbólicas e imaginativas entre diferentes elementos, promovendo a produção criativa de sentido.

O audiovisual é compreendido como um campo de forças, capaz de se conectar a uma diferencialidade eidética da memória coletiva, criando pontes entre presente e passado, entre o individual e o coletivo. Ao articular a materialidade da imagem com uma lógica de transformação contínua de sentido, permite-se que sons e imagens operem em um campo de indiscernibilidade e interdependência, promovendo uma experiência sensorial que desloca a percepção e gera novas possibilidades de significado. Como sintetiza a Tese 77 (Los Ingrávidos, 2021):

O materialismo xamânico, como processo cinematográfico e audiovisual, conduz e acarreta um filme-transe político de agitação, no qual a agitação não mais emanaria de uma tomada de consciência ou de um chamado à mobilização em massa, mas consistiria em colocar contingências e circunstâncias em transe, incluindo, em primeiro lugar, a própria Razão, relacionando violência e contingências entre si, de modo que, por meio do transe, da violência, do mito, da ancestralidade, da precariedade e da extinção, uma nova percepção cosmológica e cosmopolítica do Povo Desaparecido seja formada.

Através da Estética do Transe, o coletivo não apenas questiona os regimes de visibilidade impostos pela modernidade, mas também busca resgatar e reativar formas ancestrais de conhecimento, instaurando uma nova possibilidade de relação entre espectador, imagem e mundo como forma de resistência multinaturalista. Dessa maneira, sua produção cinematográfica se apresenta como uma expressão de resistência, na qual o cinema não é apenas um meio de representação, mas uma experiência transformadora que mobiliza o corpo, a memória e a percepção.

VI.

A produção do coletivo Los Ingrávidos representa um importante marco no cinema experimental latino-americano. Sua obra se inscreve em uma tradição crítica e estética que resiste à assimilação e reafirma o potencial transformador da imagem em movimento.  A partir da coletividade e do anonimato, rejeitam o protagonismo autoral e questionando os mecanismos de poder que regulam a produção cultural. Sua obra constitui uma insurgência contra os regimes hegemônicos de imagem e som, desafiando a gramática do audiovisual institucionalizado e contestando as narrativas dominantes por meio de uma estética radical que combina o resgate de cosmologias mesoamericanas com uma abordagem crítica à persistência dos mecanismos de extração colonial. O irreconciliável está presente tanto na organização interna do coletivo quanto na sua linguagem cinematográfica. A montagem descontínua, a fragmentação visual e sonora e a exploração de estados alterados de percepção desafiam a lógica integradora da indústria cultural e instauram um cinema em constante inquietação. A fragmentação da imagem, a manipulação da temporalidade e a dissociação entre som e imagem não apenas desestabilizam a lógica do cinema institucional, mas também criam um espaço para a reconfiguração da memória e da história.

Em obras como Transmissión/Desenquadre (2014), o coletivo utiliza a tensão entre o visível e o invisível para expor as contradições de narrativas históricas, refletidas simbolicamente na composição formal do filme. Já Coatl (2015) e Pirámide Erosionada (2019) subvertem o antropocentrismo visual ao explorar perspectivas não humanas, deslocando a fruição para um campo sensorial e ritualístico. Enquanto Coatl oferece uma experiência mais afinada ao intercâmbio perspectivista interespécie, Pirámide Erosionada proporciona um “entre espaço-tempo” transcendental acessível através da materialidade do território e da imagem.

Los Ingrávidos reivindica o cinema como terreno de confronto, onde a imagem não se limita à representação, mas age como força disruptiva. Seu cinema não oferece respostas conciliatórias, não organiza o caos em narrativas apaziguadoras, não reconcilia feridas históricas: ao contrário, ele amplifica os conflitos, mantém abertas as fissuras do tempo e transforma cada ruína em testemunho vivo da luta contra a opressão. Em um mundo onde a imagem é constantemente capturada pelo poder, Los Ingrávidos fazem do cinema um campo de disputa, onde a resistência se dá não apenas pelo que se vê, mas também pelo que se recusa a ser assimilado.

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Pedro Bezerra de Melo é doutorando em Tecnologias da Comunicação e Estéticas pela UFRJ, onde desenvolve pesquisa sobre imagéticas relacionadas ao extrativismo e à violência ambiental. É mestre em Comunicação e bacharel em Cinema, ambos pela UFPE. Artista e realizador cinematográfico, seus interesses incluem as relações entre arte, cultura visual e humanidades ambientais.

To cite this article: Melo, Pedro Bezerra de (2025) Irreconciliado e insubmisso: a estética do Colectivo Los Ingrávidos, La Furia Umana, 46. https://www.lafuriaumana.com/pedro-bezerra-de-melo-irreconciliado-e-insubmisso-a-estetica-do-colectivo-los-ingravidos/

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  1. Ver https://rsf.org/pt-br/pais/m%C3%A9xico ↩︎
  2. Ver https://vimeo.com/user15819885 ↩︎
  3. Ver https://vimeo.com/mafitv ↩︎
  4. Ver https://vimeo.com/vlopcinema ↩︎
  5. Ver https://lobosuelto.com/ ↩︎
  6. Ver https://www.mosireen.com/ Los Ingrávidos (2021) Tese 24, nota de rodapé 5. ↩︎